Sobre o caso que tem dado que falar no facebook, jornais e telejornais não me vou pronunciar muito. Quem me conhece sabe que sou pela vida, sempre, e que sou demasiado racional para me tornar radical extremista. Sabe que considero que devemos viver em harmonia com a natureza, que sinto uma especial tendência por defender causas animais, mas também sabe que mato moscas porque tenho uma irónica fobia a varejeiras, e que na maior parte dos casos não consigo sequer aproximar-me da janela para a abrir e deixar sair o pequeno animal de Deus; e que é também por isso que normalmente uso a estratégia da almofada para as matar e deixar de ouvir aquele barulho que me tira do sério, ainda que por vezes, quando estou mais calma para me controlar e racionalizar, consiga respirar fundo e num ápice abrir a janela para não ficar com mais uma mancha negra no currículo de defensora dos direitos dos animais.
Quem me conhece também sabe que não sou vegetariana, que gosto de comer carne e peixe, o que de certa forma me torna um bocadinho hipócrita ao dizer que gosto muito dos bichinhos, especialmente de um hamburguer de vaca no meu prato; mas também sabe que a minha forma de combater essa hipocrisia é, enquanto poder, comprar carne de vacas que acredito serem criadas ao ar livre e tentar comer carne apenas esporadicamente, não desperdiçando o que compro e o que como, para não desperdiçar também uma vida animal. Quem me conhece sabe que respeito a vida humana e que não poria a vida de um ser humano em causa pela vida animal se por um algum motivo tivesse que escolher. Sabe que me debato e me ponha à prova constantemente para não ser uma daquelas pessoas extremistas de que fala Daniel Oliveira. Quanto ao caso referido acho a "bonita" opinião de Daniel Oliveira uma "bonita" deambulação filosófica e moralista sobre o valioso valor da Vida, que de aplicação prática pouco tem. Por isso, transcrevo na sua totalidade duas mensagens de um blog que costumo ler e que me parecem, na sua generalidade, muito mais educativas que a opinião de Daniel Oliveira, que devemos respeitar mas também refutar. Aqui ficam as mensagens retiradas daqui.
radicais (reescrito)
«Resumo assim: a vida do humano mais asqueroso vale mais do que a vida do animal doméstico de que mais gostamos. Sempre. Tendo tido (e continuando a ter) quase sempre animais domésticos (de que gosto imenso), parece-me haver em muitos defensores mais radicais dos direitos dos animais um discurso que relativiza os direitos humanos. Porque não compreendem a sua absoluta excepcionalidade. - Daniel Oliveira.
Sobre o caso do cão que matou o miúdo de 18 meses, não subscrevo a petição contra o seu abate, mas de qualquer forma, é só uma petição e isto num país onde há touradas. A minha família já abateu um cão violento. Mordeu muita gente. A mim rasgou-me um dedo e arrancou-me uma unha, eu devia ter oito ou nove anos. A gota de água foi ter-se atirado à cara de uma vizinha idosa, podia tê-la morto. Foi o meu próprio pai que o matou com uma injecção de pentotal e foi um dos dias mais tristes na nossa história familiar. Tudo, na vida, são problemas práticos. Era um perigo constante, para mim, outras crianças, vizinhos. Evidentemente, eu era miúdo e não concordei, nem mesmo quando me arrancou a unha. Em vez de odiar o cão, fiquei foi a odiar a vizinha por ter entrado em casa sem bater à porta quando sabia que tínhamos um cão completamente doido. Fiquei-lhe com um pó durante anos. Um dia ela virou-se para mim e perguntou-me "estás de mal comigo?" e eu respondi-lhe "não" e senti-me bestialmente mal por lhe querer mal e passou-me tudo. A vida é muito confusa.
Não trocava a vida de qualquer dos meus cães pela vida dos tais seres humanos mais asquerosos teóricos de que fala o Daniel (no caso dele serão George Bush? Milton Friedman? Margaret Tatcher?) O Daniel Oliveira trai-se em dois pontos no parágrafo. O primeiro é dizer que gosta imenso do seus animais domésticos. Nenhum dono de cão ou gato se refere a ele genericamente como "um animal doméstico", sem sequer especificar se é cão, gato, cágado ou periquito e dar-lhe um nome. E segundo, não se gosta imenso.Gosta-se imenso de uma mala Chanel ou de uma t-shirt do Che Guevara. Um animal doméstico, ama-se. Ama-se como se fosse um membro da família, um melhor amigo, um companheiro. E o Daniel trai-se ao dizer que não compreendemos a absoluta excepcionalidade da vida humana. Temos católicos nos sítios mais inesperados, ocorre-me dizer, até no Bloco de Esquerda. Pensar que a vida humana é, à partida, mais excepcional que outras formas de vida, parece-me um radicalismo absoluto.
Em qualquer caso, as pessoas da petição não estão, ao contrário do que Daniel Oliveira parece acusá-los, a defender a troca de vida de inocentes pela vida do cão. Estão talvez a remar contra procedimentos automáticos e imediatos que a justiça e a sociedade tem para com os animais em Portugal, um país onde ainda são torturados em rituais bárbaros e onde a lei os considera "coisas", muito por culpa desse antropocentrismo religioso e de insensibilidade. Infelizmente, nem com Darwin fomos lá e se não fosse Copérnico, ainda era o Sol que girava à volta do Daniel Oliveira e o seu carácter absolutamente excepcional.
sobre os Pitbulls e a petição
Sobre o caso prático, não concordo com a petição. Não me choca que o animal seja abatido. O que me choca é que o dono não seja responsabilizado por homicídio por negligência, como seria um homem que deixa uma arma de fogo carregada ao alcance de uma criança. Considero que certas raças, nomeadamente o Pitbull, deveriam ser equiparadas a armas de fogo. Querem ter um? Deviam ter cadastro limpo e ser sujeitos a um processo. No Reino Unido, é proibido ter pitbulls, a não ser em casos excepcionais. Fizeram isso em resposta a uma moda cada vez mais espalhada entre os mitras, a de ter o seu pitbull. A propósito disso, o sítio onde vi mais pitbulls foi quando vivi perto de Alfama e sempre, no outro extremo da trela, um chungoso qualquer de brinco, cabelo oxigenado e boné. Uma amiga minha teve o seu cocker spaniel quase morto por um pitbull. Coincidência ou não, o dono desse cão era um refinado sacana. Depois do acidente, intimidou-a com ameaças de morte caso fizesse queixa e continuou a soltar o cão nas traseiras do prédio, onde crianças brincavam. Intimidação é o principal motivo da escolha do Pitbull. No caso de uma família com um bebé em casa, só consigo pensar em irresponsabilidade extrema. Num estudo levado a cabo pelo US Governement Centers For Disease Control, 32% de todos os ataques mortais nos EUA são causados por Pitbulls, no entanto os Pitbulls constituem apenas 2% do total de cães. Dessas mortes, 70% são crianças. Podem vir todos os criadores à tvi e sic garantir que o Pitbull é um cão como outro qualquer e procurar garantir o seu lucrativo negócio com o clássico argumento do "as armas não matam pessoas, pessoas matam pessoas", mas os factos são estes. Os pitbulls são o resultado de cruzamentos dirigidos pelo homem para criar um cão excepcionalmente poderoso e agressivo. Como tal, também vai ter mais tendência a atrair um certo tipo de donos e de contexto. Em si, o cão até pode ser mentalmente mais estável que um cocker spaniel, mas as consequências dos desvios são trágicas. Tal como não existe, na maior parte dos casos, justificação para um particular ter armas de fogo, também não existe justificação para a posse de um certo tipo de raças que sejam estatisticamente mais propensas a acidentes letais.
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