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19 de abril de 2012

DEPOIS OS, 30


Estavam para tempo repousados no poleiro do tê. Precisamente sentados no travessão. Equidistantes do prumo. Um para o outro na regra da balança.
As noites de olhos abertos duravam como longas e longos eram os cabelos dos homens misteriosos que seguiam no trilho de narcisos verdade apenas nos sonhos das crianças.
Tenho vontade de ti, pretendia ela dizer-lhe sempre que não o fazia: pois vontade era o adultério com os morangos que se abriam na boca, pois vontade era textura do sexo e o desterro do lúcido num útero de loba.
Porque somos felizes, afirmavam, ausentes de que para eles a felicidade se simplificara no eu e tu, se domara para proteger o enfeite do amor e fazer do diferente dentes e medo.
Talvez que se um se inclinasse ou se permitisse ao excesso. Talvez se um corvo viesse depois de debicar os olhos do Cristo e se lhe poisasse no ombro como memória esfumada dos dramas antigos que se obrigava a negar e não esquecer.
Penultimamente as conversas tinham-se sobre casamentos. Os homens jovens, no seu senso de mortalidade, olhavam para trás e começavam a engendrar os filhos que os haviam de seguir. Imaginavam como seriam, pensavam no que fariam e não eram os filhos eram eles, ou eram eles e os filhos ou eles nos filhos, uma revanche contra o tempo, amargura, desistência.
Se por algum a harmonia cheia do travessão se descuidasse e a letra ruísse escangalhando contornos e conforto, quiçá eles se pudessem descobrir em si e por si, engendrar a liberdade e começar de novo nos volteios de frescas palavras, vida antes do muro do agá, da procissão das letras do hábito.

 por João Rui Afonso in http://historiasdaninhas.pt/


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